Pular para o conteúdo principal

Bucolismo

Com tua carroça cheia dos restos da cidade

O catador para diante da margem do rio

É um rio largo, escuro, mal cheiroso

Ele observa o reflexo nas águas, suspira e vai embora:

- Esse rio é tipo um abismo.


Todo dia passa ali, com tua carroça colorida de catador.

A engenharia é uma piada tecnicista

Tem uma TV quebrada

Num celular, uma antena de carro, só por ironia

Um CD de um grupo de Axé que já acabou

- o resto de uma alegria do passado -

Uma boneca vestida com roupa de mecânico

Restos de móveis

Restos de roupas

Restos de memórias fragmentadas.


Ele mira o reflexo nas águas, suspira, e vai embora:

- Esse rio aí, é um imenso abismo.

Todo dia é a mesma coisa.


Do outro lado da margem do mitológico rio: 

A vista bucólica de um jardim bem cuidado

Casas em seu devido lugar

Pessoas em seus devidos lugares

É tudo como se fosse um sonho.


Ele olha as águas, se vê no fundo distorcido, suspira, pega sua carroça e vai embora

- Um dia atravesso o rio.

O rio é quase sem fundo e quase sem vida.

Postagens mais visitadas deste blog

Ciência da Humanidade

Peço desculpas ao rapaz da IBM que estava lendo o livro de Richard Dawkins, Deus: Um Delírio, e que foi rapidamente atacado por mim, por falta de coragem de encarar que existem realidades diferentes da minha. A matemática sempre me fascinou. Não só a matemática, mas tudo o que a usa como ferramenta, os números, a filosofia, a física, a biologia, a química, a engenharia, a economia, as ciências da informação, as ciências dos softwares, as linguagens de programação, a música, a pintura, a astronomia, a poesia, a eletricidade, tudo o que se originou da harmonia dos números, tudo isso pra mim é arte. Se existe algo que já me incomoda faz muito tempo nos sistemas educacionais do Brasil é essa distinção cada vez mais forte entre Ciências Humanas e Ciências Exatas. Eu ouço essa dissociação como o som de uma facada no meu peito, isso realmente me dói e me incomoda. Para mim tudo é ciência humana, até mesmo a matemática. Eu sempre me lembro da frase de Darcy Ribeiro que disse certa vez...

Na Praia

Contempla a pedra una o nascimento Do suntuoso Astro que se lança Como o materno elance tua brasa Extirpa da minha vida o lamento. Beija-me os pés com tal candura A alma que imortal e majestosa Clara, tão macia e arenosa Da vida, abranda a desventura. Dança com o silvo de uma brisa Restaura-se o grão o teu domínio Incauta testemunho-lhe a misa A carícia que faz-me a imagem. Já não mais soa como o eterno toque Que na memória o gesto imortaliza Vez a vez se aparenta-se imponente A cena que comove-me o enfoque. Cavalga mar adentro a ventania Prata e prata no celeste horizonte Manto líquido, tua sabedoria Áspero, feroz limpa o Flegetonte. Olha a pedra do flamejante prenúncio Do grande Astro que o braço repousa A ocre cor que em seu leito se esconde Salva-se o mar perene de silêncio.

Tua Palavra

Palavras como fios E teus dedos costurando Um caloroso manto Para minha sombria alma. Palavras, que como pão Desta tua fome tão antiga Onde cada sílaba que canta Vira a ceia da minha calma. Palavras, como tuas mãos Que quando escreves meu nome Eu sinto O calor do teu gentil enlaço. Palavras como a brisa A brisa que te trouxe até mim No alívio das noites infernais Na doçura dos teus braços. E se ousa um dia duvidar Da força daquilo que escreve Lembra: O mundo que antes era só escuridão A vida que antes era nada Começou tudo, até amor Pela Palavra.