Meu pássaro roubado de mim
Via teu reflexo no espelho do fundo da sala
De lá de dentro de tua gaiola fazia sombra
Teu canto soava belo, sempre soa belo (é incrível como ele sempre é estridente e belo!)
Repleto das minhas vontades e dos meus desejos
Cheio daquilo que quis amar e não pude
Completo daquilo que quis ter e não tive
Lúcido do teu próprio cárcere
Existindo e pela felicidade.
Vez ou outra, pela frestra da janela
Um feixe de luz lhe aquecia
Vez ou outra, vês um galho de árvore solto
O verde das folhas
Sente a brisa nas suas penas
Via teu reflexo no fundo dos teus olhos
O desejo pelo sol nascente
A caça pelo teu ninho
O teu vôo torto
Tuas feridas
Teus remédios
E tua sanidade numa cruz de madeira
E teve aquela vez em que você decidiu
Que ao invés de ser pássaro
Queria ser gato
E passou o dia inteiro tentando lamber a si mesmo
Até sentir vergonha
Que coisa tola sentir vergonha
Providência, psicomaestria
Porém revolucionária
E quando decidi por mim abrir tua jaula
Voou e fugiu
Nem se despediu
Fostes roubado por mim.