Domingo do Senhor É dia de varrer a casa. Ouvi, há muito tempo, um estrépido troante Como o som de um vaso oco estilhaçante E era mesmo um vaso a princípio muito ornado. Ou quem sabe era a forma de uma estátua O abedé de uma deusa, Euterpe, Calíope, Psiqué ou Erato. Quanto tempo que esse estrondo aconteceu? Foi descuido ou a força de um grito? Foi um tombo distraído, ou força do hábito? Ou quem sabe uma palavra mal pronunciada Titubeia pela pressa de pouco perceber. Será que ninguém notou Todos os pedaços espalhados pelo chão? Pai, mãe, filha, companheira E a carne que espeta nossos pés O sangue entrecruzando nosso rastro? Faltou coragem Faltou muita determinação Encarar o meu pedaço Num fragmento ensanguentado pelo chão. E hoje, que nem era Domingo do senhor. Hoje que era um dia qualquer... Todo dia se parece No Domingo varrendo os fragmentos.
Todas as noites em que eu sonhava, não importava o tema ou as imagens, estava presente uma ponte que flutuava bem alto lá no céu. Não era uma ponte comum, em que era vista de baixo para cima, ela realmente estava flutuando no céu, cortando toda a dimensão do horizonte até onde eu pudesse ver, de leste a oeste, e não se conseguia ver o começo, ou o fim, por mais que eu fizesse um esforço, ou caminhasse por dez dias inteiros, ou pegasse uma carona com algum estranho, essa ponte não me permitiria saber o que se encontrava em suas extremidades. Se eu sonhava que estava na minha sala de aula, lembrando das pessoas que fizeram parte da minha infância, ao sair da escola, eu notava cortando o céu azul aquela imensa ponte, em que as extremidades se perdiam em um caminho interminável. As risadas dos meus colegas indo em grupos ou em duplas para suas casas me despertavam um misto de alegria e isolamento. Quando eu sonhava que estava andando sobre a areia da praia, ouvindo o som da espuma molhando...