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Mostrando postagens de junho, 2025

Tua Palavra

Palavras como fios E teus dedos costurando Um caloroso manto Para minha sombria alma. Palavras, que como pão Desta tua fome tão antiga Onde cada sílaba que canta Vira a ceia da minha calma. Palavras, como tuas mãos Que quando escreves meu nome Eu sinto O calor do teu gentil enlaço. Palavras como a brisa A brisa que te trouxe até mim No alívio das noites infernais Na doçura dos teus braços. E se ousa um dia duvidar Da força daquilo que escreve Lembra: O mundo que antes era só escuridão A vida que antes era nada Começou tudo, até amor Pela Palavra.

Liturgia dos Corpos Doentes

Conheci um dia um artista que me despiu por inteira Despiu-me com palavras Com olhares Com um toque suave Mas de tão suave que me fez incendiar Gritei teu nome como se grita por uma prece E ele, ele orou em mim Fui deusa Ele foi altar Fui esperança Ele foi templo e contemplação! E quando balançou teu aspersório Fui tua bacia de água benta Tu, lavou-me em oferenda e salvação. Diz ele para mim Escrevo, escrevo sim um poema Neste teu coração vadio e sem rumo Porque escrevo como quem sangra E te amo como quem morre. Ouço longe como do outro lado do mundo O lamento de um passarinho solitário Tenho ele preso em tua jaula Venha buscar a tua chave Através dos densos caminhos do meu bosque.

Eu Fico

Te escutei no acorde mais bonito Da canção que mais me faz chorar Quando te lembro em meus braços Sinto que enfim tinha meu lar. Tuas paredes lisas, plenas de aberturas Mas eu também estou quebrada E é nessa cama em que estivemos Que eu enfim estive amada. Pelas tuas frestas sussurra a luz suave Que te ofusca em sombra, mas a mim protege Te entrego então estes versos, não promessa Como a oração de quem te amou sem pressa. Falhei, falhei, perdão amigo Não tive como ti a mesma força Mas saiba, na memória, que é comigo Dos doces beijos de agonia me contorça.

Sopa de Indignidade: O Amargo Exílio do Mérito

Algumas pessoas tem um jeito tão belo de recontar a própria história, que eu decidi também recontar uma história de uma fugitiva que se vê como heroína. Aqui vai. Estava eu um dia em uma NAU, sério, eu realmente estive em uma NAU, não um barco, não um navio, mas uma NAU. Eu de repente virei o Maurício de Nassau, o Gigante Holandês, e saí colonizando tudo, até mesmo a minha insegurança, mesquinharia, avareza e infâmia. Porque se tem algo que eu realmente prezo nessa vida, é a minha necessidade doentia de parecer virtuoso para todo mundo que me conhece. Então aqui vai: Tua nau, tão nobre, tão tua — que sorte! Ergueu-se ilesa das marés... imaginárias. Leva contigo tuas âncoras de autoaplauso. Sopra teus ventos — mas não esperes que eu os sinta. E eu, que nem marinheiro sou,  Quase que naufrago por distração. Foi acidental, não me preparei. Como cruzar um desafeto no mercado da alma, entre pêssegos e demoras. Nada dramático - apenas inoportuno. Tuas palavras são tambores numa guerra qu...

A Brisa Incandescente de Teu Calmo Olhar de Fogo

No pálido outono da minha lembrança tu caminhas, leve, sem ferir o chão. Teus olhos azuis — dois portais de bonança — me enxergam inteiro, mesmo na contramão. Ela entra e o mundo esquece o eixo. Cada gesto, uma dança de navalhas e flores. Fala como se amasse — e fere como se fosse a própria musa do furor e dos amores. Teu riso era cítara, teus passos, harpa, e no fio da tua ausência me equilibro. Foste, e eu fiquei feito folha que farpa a si mesma num vento sem livro. Sua palavra tem perfume. Sua carícia, febre e calma. Ela me queimou com beijo e depois soprou minha alma. Tu és minha oração não rezada, minha infância não salva, minha irmã sem idade, minha estrela mais clara. Ela dizia: “vive, idiota!” E eu morria um pouco mais. Ficava olhando sua boca, como quem tenta ler sinais. Ainda me acenas nos sonhos — e, mesmo dormindo, eu sei: não há morte que te leve nem tempo que te levei. Ela foi Mas ficou em cada verso que grita, em cada vinho derramado, em cada noite infinita. E é no silên...

Ao menino de 1998

Em uma noite qualquer de 1998, um menino. Ele se encolhe no chão, agarrado aos joelhos, chorando por... por todos os motivos que sempre o faziam chorar e se sentir profundamente solitário e abandonado. Ele escuta uma voz no escuro: "Ei, pare de chorar. Enxugue estas lágrimas, e pare de ter medo. Olhe esta caixa debaixo da sua cama. Hoje o dia foi bem difícil, como a maioria dos dias. Mas debaixo da sua cama, veio de um tempo distante, mas não tão distante assim, uma mensagem para você." O menino se levanta, busca coragem e olha. Tateia com a mão e sente um objeto retangular. Debaixo da cama ele encontra uma caixa de madeira simples. Ele puxa com curiosidade, levanta-se do chão como um herói abatido, e, com a caixa nas mãos, vai até a cozinha. Acende a luz e senta-se na mesa do jantar. Ao abrir a caixa, descobre uma carta escrita a mão em uma caligrafia séria e gentil. Não sabe se deveria ler, porque não tem certeza se a carta é para ele, mas ele lê mesmo assim. A carta dizia:...

O Lugar Onde a Esperança Volta

  Por Estevão Bruno Steiner Não é longe, nem alto, nem exige passaporte ou merecimento. O lugar onde a esperança volta é onde a dor já passou - mas deixou espaço. É dentro. Mais fundo do que a mágoa, mais calmo do que a pressa de sarar. Ali, onde só Deus e o silêncio sabem entrar, a esperança se refaz sem alarde. É um suspiro, uma brisa, um “ainda não acabou” sussurrado por dentro quando tudo parece perdido. Não é uma promessa de que tudo vai dar certo. É a certeza de que, mesmo que não dê, a alma seguirá firme, porque aprendeu a andar mesmo de joelhos. Ali eu volto, sempre que o mundo pesa, sempre que as palavras falham, sempre que o passado tenta gritar mais alto que o presente. É ali que reencontro a luz - não a que cega, mas a que guia.  E caminho. Com fé. Com paz.  E com um novo nome escrito no coração: Recomeço. Estevão Bruno Steiner

Cometa!

 - Você ouviu dizer no jornal que um meteoro vai rasgar o céu? - Sim, meu amor, mas não importa! Deita! Dançamos ao som do caos Fiquei rouca, fiquei louca Tatuou suas mãos em mim Em todas as partes de mim Até onde não conhecia Lá, estrondo, poeira, desespero Aqui, a trombeta do regozijo Lá, morte Aqui, sono. E então, uma mancha laranja persistia no céu A destruição era bela, fascinante, encantadora Teu calor ainda jazia A cratera do meteoro no chão me fez chorar a tarde inteira. Meteoro não, cometa!

Mercador do Teatro

És o melhor, o melhor do mundo! Disse-lhe o mestre da pintura O melhor! O melhor do mundo! Encara a obra presa à parede Uma banana e uma cadeira Tens pois, aí, a decadência em quatro estágios Engana-se quem pensa ao contrário Diz o crítico do diário É a pós modernidade em madeira Professa o douto sábio Em sua acolchoada cadeira Quem sustenta, sobre as pernas, a natureza? Uma banana e uma cadeira à parede Sublime símbolo, pura beleza! És o melhor do mundo Era o que tudo lhe dizia. Décadas depois, em uma choça aos trapos Morria. O que é que aqui vem representado? Pergunta lhe o jornalista  Arregalado à fortuna obra  Aqui tens uma banana Aqui tens uma cadeira Disse-lhe o cênico mercado.

Meu Pássaro Roubado de Mim

Meu pássaro roubado de mim Via teu reflexo no espelho do fundo da sala De lá de dentro de tua gaiola fazia sombra Teu canto soava belo, sempre soa belo (é incrível como ele sempre é estridente e belo!) Repleto das minhas vontades e dos meus desejos Cheio daquilo que quis amar e não pude Completo daquilo que quis ter e não tive Lúcido do teu próprio cárcere Existindo e pela felicidade. Vez ou outra, pela frestra da janela Um feixe de luz lhe aquecia Vez ou outra, vês um galho de árvore solto O verde das folhas Sente a brisa nas suas penas Via teu reflexo no fundo dos teus olhos O desejo pelo sol nascente A caça pelo teu ninho O teu vôo torto Tuas feridas  Teus remédios E tua sanidade numa cruz de madeira E teve aquela vez em que você decidiu Que ao invés de ser pássaro Queria ser gato E passou o dia inteiro tentando lamber a si mesmo Até sentir vergonha  Que coisa tola sentir vergonha Providência, psicomaestria Porém revolucionária E quando decidi por mim abrir tua jaula Voou e...