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Desabotoando

Já estava a receber De manto branco o cavaleiro Alojador de pernicidas Pernicioso, presunçoso - É uma menina! Limpavas as mãos o orgulhoso. E em terra que se cava com ardor Depois da tempestade carinhosa Nasce ali uma solitária flor. E solitária é toda flor que desabrocha Pois da árvore só o fruto é devorado E bem sabido é que o rimador Sempre vai rimar a flor com dor. E aquela que é da mais esperta Convalescente cria seus espinhos E na flor que a mão vadia se estapa Ali o sangue cai devagarinho.

Às Espumas do Mar de Chipre

Ó filha do céu e do mar Venha banhar-me do sagrado ventre de tua mãe E desse líquido divino faça de mim A tua mais pura serva Invada minha alma com tuas rosas serenas E alivie por momento a minha loucura. Ó benfazejas espumas Que ardem e suavizam E sem dores escravizam Às tuas incorruptíveis vontades. Quando apagaram as luzes dos tempos Vestida de demônio e maltrada fostes Mas é no macio dos mares Que escondes tua liberdade.

Primeira

Tantas cores, tantos rostos Vento fresco e fresco osso. Quando ao peito me atentei Minha alma deportei Para o confortável dorso. E ali meu coração Enuviado de emoção... Cheio de explosivo medo Cheio de mãos e com um dedo Fez-me gritar... no chão.

De cabelo e óculos (De Meninas e Mulheres)

A pele é jovem 'inda macia Já carregas dentro de ti Uma alma enrugada de sabedoria. A lente precoce da visionária De alma confusa e absoluta Jovem menina extraordinária É de meninas e de mulheres Que traças o caminho, a trajetória É de meninas que fazes a história. A pétala é pura realidade Mas teus perfumes e lembraças São ilusões de tua idade. E o sonho vivo, a felicidade É o preço mais caro por qual procuro E mesmo assim de madrugada, Sem perceber, Tu encontras o sonho puro. Mas não te apures em desespero Mesmo sendo este o dever humano A vida é hoje dia de encanto E sem motivo amanhã é pranto.

Os Homens e Seus Números

Os homens e seus números Não escutam nossas vozes São apenas homens cartazes Com sorrisos de eleição. - Prometo cama, água e feijão! - Sim senhor, sim senhor! Espero aqui bem no chão. Os homens e seus números são como colheita de coca Que de tempos em tempos vêm, pra dar tempo de cuidar Distribuem o produto todo, compramos ao bel prazer Ficamos cheios de coça vivendo alucinações No tempo da colheita até sente-se esperança bater à porta - Eu vejo um céu azul! - Eu vejo um trem suspenso a toda velocidade! - Já eu enxergo pontes, estradas, avenidas e túneis! - Eu consigo ver uma limpa cidade! Mas o homem que é tão careta e sem religião: - Dessas coisas aí? A fome é tanta que não vejo nada. E quando a colheita acaba Volta a cambada para a braça. As fardas por aí agridem Os homens que vivem de praça: - Ei ei, coca aqui não!  E lembro quando uma farda azul estrangulava um anjo na estação Anhangabaú. Depois só veem-se os números Brigando feito vespas Por um fiapo de fezes No pátio dos republi

Morta-Viva

Vive hoje pisando em relva A beber do mel silvestre Nas flores do belo campestre. E Sentindo o coração pulsar Sentindo a alegria bater Se fosse como a imaginação solta Aguardando a boneca a andar. Ao longe barcos vêm chegando Indefinidas cores flutuando. Nódoas roxas surgem pelo chão Drágeas perfumadas explodindo A minha imagem é o que vejo sorrindo. Tão sóbria estive pra viver E morta agora vivo sem querer. Aos poucos para a cova vou marchando Mais cruel sozinha do que antes O sino toca em meu pulso espumante.

Humano/Desumano

 Humano Quero imaginar uma vida sem marcas Onde eu não precise comprar a alegria Pagar a felicidade E financiar a tristeza Onde o bem estar venha numa brisa E não encaixotada e de presilha Quero me lavar nas águas límpidas da verdade E arrancar a casca e o pus Das feridas em liqüidação. Às carcassas fétidas e mentirosas A essas quero dizer não! ---------------------------------------------- Desumano* Se no mundo não houvesse nenhuma marca Não haveria também a diferença Se há alguém que criou isso É porque há quem compre e quem venda. O bem estar vem de uma brisa de onde for Apenas precisamos desprendê-la A verdade está nos olhos de quem vê E na busca que cada um faz da sua vida Na real, não existem as feridas. Se o mal e a mentira não existissem Ninguém sentiria falta da verdade Lola Marin *Desumano é o poema resposta que a Angélica, minha colega de classe (pseudônimo de Lola Marin), escreveu espontâneamente assim que leu o meu texto. Achei extremamente criativo e é como se tivesse sid

Dança arritmada num domingo à tarde

I - Escolhi meu par e fui dançar Quando fechei os olhos e pra longe Dancei na minha confusa ilusão, Um anjo bom e puro, não sei onde Abraçou-me a espantar a solidão. O anjo não tem sexo O anjo não tem cor. A cor provém da alma de sexo pecador. E dos lábios, proferidas com ardor, Como vento aos ouvidos sussurava Palavras de suave e belo amor. - É  um dom! - eu, que quase acreditava. II - A Dança avançava deixando-me em transe: E como se dentro do aconchego Do ventre materno refugiada As palavras guiavam-me ao eterno, Ao eterno criador desta morada. O Deus que não tem sexo O Deus que não tem cor. A cor e sexo vêm Do Diabo pecador. E agora em idéia impossível Perdi do início e o fim a compreensão. Se era homem ou mulher, já não sei não. Pois já nem via mais o que é cabível. Porém... III - O Acordeon perde o ritmo: Num estalo de um céu que relampeja Vi a clara realidade nua e crua. Vi o homem que vinha de bandeja Vendendo simples doces pela rua. E

Verde

 Vestiu-se de verde Veio até mim Faltou-me o sangue E o ar. Feriu com a espada Do veneno da verdade Curou-me depois Com o milagre da bondade. Andei sobre a tábua Aquela, fina demais. Caí inúmeras vezes E sua mão eu segurei. Pensei muitas vezes em chegar sozinho Mas onde? Se não sei, não quero saber sem você Pois quero descobrir no final Carregando-te no colo Por enquanto hoje, humildemente O que carrego no coração.