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Meu Verso é Minha

Meu verso é o espelho Dessa alma rouca Não é espelho de velho É espelho de louca. Meu verso é doença É esparsa demência Meu verso é desgraça É eterna indulgência. Meu verso é desgraça Do berço suave À vida mormaça Orquestras e Clave Orquestra de graves E suaves agudos De graves entraves De amores mudos. Meu verso é demência Meu verso é Entrave Meu verso é fineza De tristeza grave. Meu verso é triteza É falsa beleza É desgraça falsa É alma descalça. Sou verso do avesso Sou verso do osso Sou beça do poço Sou oca no moço. Meu verso é ter tudo E não enxergar nada. Meu verso é ver mudo É ser namorada. Meu verso é o verso Meu verso é o avesso Meu avesso é verso Da vida que averso. Meu verso é o avesso Da vida suave Meu verso é o avesso De amores graves. Meu verso é o desejo De não ser mais versa. Meu verso é o desejo Do amor suave.

Malrboro

02h00 A.M. - Toma aqui: acende... Está aceso e a chama o consome. Bem pouquinho, vai indo. O vento bate no meu rosto e eu não sinto nada. Estou dormente, morta, só esqueceram de me pôr num caixão. Vai consumindo, aos poucos, aos poucos... Entra a toxina, sai a fumaça branca, pura... sopro um pouco da minha alma em cada vez. Você acaba de consumir mais de 4000 toxinas diferentes, não há instruções de consumo seguro para este produto. Tomei aqui, acendi. Ei demônio! Demônio está aí? Eu sinto que tem um demônio aí fora me rondando e me roubando de mim mesma. É o demônio de fora? Ou o demônio de dentro? Quem é você demônio? Já foi? - Então toma, acende outro. Fshhhh faz o barulho que queima. Consome outro, que logo acaba, aos poucos, aos pouquinhos... É só uma picadinha moça, só uma. Doeu? Doeu. Quero flertar com o anjo bom pra ele preencher minha alma. Deus, Deus! Ajuda a menina que está aqui! Vou ligar para a Lídia. Não... Vou ligar para papai. Não, melhor a mamãe...

Oração à Hlin

Quem pisar no assoalho Através das minhas portas Com andar de quebrar galhos No chão encontrarão mortas As lágrimas derramadas Por olhos secos e falhos Ambas mãos tão gordurentas Tolas. Força fria e pálida. Tão amargas e nojentas, Falsa impressão doce e cálida. Faces vultas macilentas, Lábios murchos língua árida. Na aurora sempre bebo Do mais puro e nobre vinho. No crepúsculo o medo Do incógnito vizinho O fantasma que com o dedo Mi’alma rouba de pouquinho. E aqui permaneço indene, Pr’aquele próximo, esperando, De alma grande e solene Que em seus braços carregando Minha lágrima perene Para os céus irá levando. E no inferno permaneço No chão frio do assoalho Que adormeço, que mereço! Que explodindo entre galhos. Desta vida do avesso De olhos secos e falhos.

Desacostumado

Estou habituado às alegrias complexas: Um olhar de verdade Um toque de verdade Uma voz de verdade. Trocar a noite pelo dia... Não, não. Não é do meu feitio. Encarar a face magenta da multidão E descobrir pacientemente ali no meio Alguma perebazinha digna de nota. Pular de praia em praia Correr de braços abertos E cantar a liberdade (Com notas desafinadas) Abraçar a espuma corrosiva da água do mar Cheirando a enxofre e peixe morimbundo. Rir para o nada Pois o nada é mais engraçado Fazer nada Pois fazer nada, é mais confortável. Não estou habituado A não sofrer como os desgraçados Que se embebedam de livros e idéias E não conseguem debater alguma Pois a música é muito alta E os ouvidos são muito surdos. Só estou habituado à voz Que em silêncio sagrado atinge Os tímpanos da alma doente Que lamenta ao fantasma impassível Aquele que com apenas um dedo Amargura o espírito inquieto. À voz que me tange de água fresca E me faz pensar por hora Que sou imortal.

Maia

 Não Eu não te quero conhecer Pois o medo que tenho De que tua aura angelical Seja desfeita e infectada Pela vil nossa imperfeição palatal É tão grande ou mais Que padecer diante de uma doença mortal E antes prefiro morrer com a pureza de tua imagem Do que viver a vida em angústia realidade. Não Não te quero conhecer.

A Porta Branca do Paraíso

Duendes em volta do meu leito O cheiro, que cheiro! Perfumes que me deixam nostálgica Cores do cavaleiro. Ai! Que cavaleiro Veio aqui, nessa noite mágica. Estrelas mortas caem do céu como lágrimas E cada uma que despenca se explode, se destrói Pelo desejo tão pedido que não foi realizado E em lugar da esperança, um corrói E um negro espaço cósmico de mim apoderado O cheiro de água me lembra a tarde O calor úmido gostoso e abraçado As flores grisalhas de um tempo que não foi meu O riso que não foi meu Do rosto que não foi meu Da alma que não foi minha E nem foi a estátua afrodítica no aguardo de uma alma pobre. Pobre alma, feita de carne podre Carne fétida enlamaçada Escorando pela parede deixando manchas estrábicas. O piso branco ensangüentado em cada passo pisado Feridas profundas entre os dedos pesados Arrasto e escorrego nesse chão duro da mortualha E com a língua lavo o solo amargo avermelhado Não é da carne enlamaçada que o sangue escorre Esse é o san

O Impossível Desejo

Veio vindo pela calçada o velho Idoso já da idade cansadíssima Viveu vinte e sete anos vegetando. E repentinamente vinha Cruel e veloz Violenta A motocicleta da morte, que lhe tirou a vida. O secretário Divino ao ver o registro de óbito disse: - Isso está errado, o senhor morreu em outro lado. Veio vindo pela calçada o velho Mesmo Já idoso da idade extrapolada Vinte e sete anos de uma vida degradada Chegou em outro canto e deu mais uns passos Viveu mais uns dias E morreu de infecção urinária no hospital quase sem placa. Acordou um dia desses o velho, respirando livre o ar da vida Satisfeito das ressurreições mágicas da medicina E morreu do coração amando uma menina. Recorreu à sua culpa, numa ultima tentativa O secretário já cansado, deu-lhe uma alternativa Mesmo assim a vida insistia em se deixar vencer E caiu mais outra vez sem ao menos perceber. Fecharam sua porta agora em definitivo Enterrado ao lado dos seus conterrâneos Na lápide haviam escrito: "Mesmo morto, em nossas memór

Pequeno Mito Grego

A dúvida era certa, mas o prazer de se estar vivo era inexplicável. Aquela criança tinha um Hércules no sorriso. Sabem do que falo, daqueles sorrisos que até fazem eco nos corredores da escola. O sorriso que corre junto, na hora que bate o sinal do intervalo da escola. Era um pequeno Hércules, já com os dons da retórica apenas no caminhar. O seu andar era um discurso político. Debate político. No dia seguinte todo mundo comenta, rindo gostosamente no aperto do ônibus (aquela bendita maldita linha para o Terminal Bandeira, como prato de pedreiro transbordando, assim pelas bordas). Era tal o poder do sorriso do menino. Chovia sim, chovia muito. Mas na hora em que abriu os olhos e refletiu neles o céu, o próprio céu, grandioso se compadeceu. Abriu-se todo, mostrou sua claridade morna. Aquele cheio gostoso do verão, cheiro de mato e terra molhada. E vem aquele morno acumulado pelo excesso de lixo nas ruas, a rua tão quentinha e quase lavada que dá até vontade de deitar. Vem corren

A Boneca de Pano

Tem olhos de plástico Costura em linho Mas pele em vime De olhar estático. E solta bolinha Por baixo da saia De falso cetim de Vermelha Fitinha Vigia de cima Da jacarandá Em cubo esculpida A jovem menina Que chora tão triste Olhando pra estante Aquela boneca Que nunca desiste.