Pular para o conteúdo principal

Prelúdio Urbano

I.Moderato


Tarde de Sol escaldante no bairro

Um casal se prostra à beira da porta

O Gato se entrelaça aos pés da moça

O cão do moço, dorme, escondido e envelhecido,


         Quase morto atrás da porta.


Estendem-se muros velhos,

Onde as crianças brincam de esconder;

Ninguém sabe onde se encontra ninguém.


Estendem-se trepadeiras secas e cadavéricas,

Onde deveriam estar ramalhetes.

As donzelas já não são mais donzelas

E o amor põe-se a chorar no coração dos moços

Dando lugar a notícia.


Os sinos das Igrejas tocam descompassados

Só vejo agora, anjos feitos de papel, flores de plástico

DEUS À BEIRA DO PENHASCO

E o nosso desejo acima de qualquer suspeita.


II. Allegro non troppo


No meio do terreno baldio, 

De onde se ouvia o prelúdio urbano

Havia um homem comendo micróbios. 

De trás da sucata, 

Um menino o comia com os olhos.


No meio da avenida um amor perdido

De onde se ouvia o prelúdio urbano.

Um coração dilacerado e sangue pra todo lado

Ai, e aquelas exclamações apocalípticas que matam...


Mas havia uma história

Inacreditavelmente havia uma história.


O menino comendo com os olhos...

Parecia querer usar a boca, estrear as gengivas novas

Mas só podia com os olhos.


E no meio da avenida, aquela donzela inconformada

Com sangue no meio das pernas, sangue pra todo lado.

Mais um amor enganado...


O prelúdio urbano tocava, e o povo acompanhava


III. Lento con brio


O céu rasgado pela chuva que devia brotar,

Mas essa chuva só chove, só molha, só esfria...

A chuva que lava o sangue derramado

Ai, no meio da avenida, o prelúdio urbano,


Havia uma vida...

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Chamas de Yemanjá

Almíscara penumbra O ar que pesa em febre As sedas ardem chamas Verte-me a maré da criação. Recebo em exortação As faíscas que te explodem sob a pele  Cubram-me, estrelas cadentes. Ergo-te minha aberta taça Largo anseio a coletar Neste cristalino cálice As pérolas de deleite mar. Perfeita ondulação Com um arqueio para trás Transmuto em Eva Rosa aberta das Mil Noites Das mil insaciáveis noites! Sem medida. Deixe que caiam Que cerquem-nos as brumas Banham a alma o noturno orvalho Ouça este canto É a beleza do profano hinário. Neste sonho vivo Altivez de devoção cutânea  Rito ao lúgubre exorcismo  Governa e acata simultânea. Sorve dominada a benta água Aceita a nativa incumbência  A viva e infinita exultação. Quente e pesada Cai a noite Salto na cidade inteira Soltas rubras copas Sem medo Reflexo brilhante das estrelas Embebe o lacre dos segredos. Quente e pesada Em açoite Salta a cidade inteira Um, dois, três, quatro Brindem ao pórtico Abraçados às cortinas Rasguem o m...

Erospectro

Dança a débil seda da cortina em altivez Acaricia, enquanto sôfregas, balança O alabastro lívido de porcelana tez. Ajoelha ante a luz da superfície pálida Princesa portentosa do teu estreito templo Aporta em silhueta a majestade cálida. Anda, paladino, sobre a laiva curvatura Forrada do plantio de calêndulas laranjas Descansa à boda quente da lacuna escura. Venera esta abadia, pétala a pétala Diante da minha dupla onírica imagem Repousa em cada vale de divina sépala. Despeja-me o orvalho em êxtase, a coroa, Na carne-alvura arqueja em nosso infausto cio, Em véu e labareda, um altar, uma pessoa. E quando finda a música, resta-me a visão: Princesa, diabo, luz, deleite em união, No espelho sorridente à criadora perdição. 

Dez Mil Dias

Certo dia foi assim Peguei o ônibus Sentei na calçada fria Esperei falarem comigo Deixei a mão suspensa, em vão E em um gole, matei minha sede Para no segundo seguinte Você não estar mais aqui.  E soube certa vez Que não estava mais aqui Às vezes Quem não está Parece nunca ter partido. Te via na luz Te via no amanhecer Te via Te vejo Na minha vontade de morrer. Tua voz que parei de ouvir Ainda soa para mim. O teu perfume de ternura Sinto em todo lugar O teu semblante de aurora Vejo-o nas pontas dos dedos. E sobreponha a  eternidade Entre o que plantou em mim E o fim do mundo E você ainda estará aqui. É assim mesmo. Porque  Ante a catástrofe  A confusão A existência O desamor e a desilusão A tristeza e o rancor As mágoas e a reclusão Três palavras Quatro sílabas A minha incapacidade humana de decifrar A dissolução da minha angústia: Eu amo você. 📿📿📿📿📿📿📿📿📿📿📿📿📿📿📿 Tudo isso começou no dia 06 de Maio de 1998.