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Diazepam

A sociedade brasileira se equivoca. Não quero delimitar um grupo, pois hoje, todos se equivocam. O caos social impera, e isso é favorável a poucos, terrível para a maioria, pois não temos uma unidade. O que antes poderia ser motivo de poesia e admiração, hoje é um grave fator para o impasse que vivemos. Nossa diversidade cultural e étnica já não me encanta mais, ao contrário, me assusta.

Psicólogos admitem que a crise é favorável à mudança. Se as relações sociais se dão através do contato de uma pessoa com outra pessoa, então passemos a tratar o Estado como um corpo vivo, e não mais como uma idéia. Tratemos de enxergar que o Estado, que serve à sociedade (e não o contrário, como ocorre em nosso fascismo mental disfarçado de democracia) está sofrendo com uma doença horrível. Nossas células estão desordenadas, entrando em choque constante. Uma vez divididos, há o impasse, e havendo o impasse, perde-se a perspectiva. Caímos no mal estar da depressão coletiva. Falta esperança, e faltando esperança, falta-nos a força de vontade. Para quem já teve a auto-estima em estado decrépito, sabe o quão difícil é se levantar da cama. Precisamos de estímulos para viver, precisamos acreditar em algo. Mas esta crença nos é roubada diariamente. Quando a dor é em excesso recorremos à alternativas de alívio: drogas medicinais, drogas alucinógenas, bebidas alcoólicas, auto-mutilação, suicídio, mental ou físico. Já nada mais importa, já nada mais faz a diferença. Qualquer discurso amigo vira referência. Qualquer sonho, por mais inútil que seja, vira referência. Eis então que me sobra apenas uma pergunta: para que serve um país? Para que serve a minha necessidade de auto-estima? Afinal, para que continuar vivendo? Para quem continuar vivendo?


José sonha com croissant.
Pedro sonha com colchão de molas.
João sonha com seus mata cavalos.
Paulo sonha com peteca e bolas.

Havia ruído e agitação na multidão
Quantas caras
Quantos sonhos
No cárcere das mentalidades
A corrente mais dura
Se constrói nas imagens das cidades.

José pegou os lixos das calçadas no Morro dos Ingleses.
Pedro altera o ar no condicionado auto italiano.
João escolhe entre papel e papelão
Paulo troca os calçados franceses por meias de algodão.

Nas estações de rádio
Durante o REM do despertar
Todos atentamente ouviam
O Presidente da República discursar.

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Bucolismo

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O Lago

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