Pular para o conteúdo principal

Maestro João Carlos Martins e a valorização da tragédia na TV

Minha mãe estava me contanto hoje sobre o Maestro João Carlos Martins, que visitou um programa de TV aí (não sei o nome, não assisto TV há muitos anos).

O maestro vive um drama pessoal, é um pianista, apaixonado pelo ofício, tem na música a sua própria motivação para viver, e por causa de um assalto, onde sofreu uma pancada na cabeça, causou-lhe um problema neurológico que o impede de ter o movimento natural das mãos, quase impossibilitando que toque piano.

Neste programa ele começa a tocar uma música no piano, apenas com o dedo indicador de cada mão, e em dado momento, começa a chorar: o motivo, um jovem promissor, da música (segundo minha mãe) morrera por causa de uma tragédia de violência.

Minha mãe falava isso com uma voz piedosa e uma expressão de pena, e se via tocada por isso. A TV tomou tamanha proporção na vida das pessoas dos anos 50 a 2000, que esta geração desse período de 50 anos foi completamente convencida a dar qualquer situação nessa tela como verdadeira. É quase impossível alguém questionar algum fato que nos corre pela tela, a menos que ele não corresponda com algum valor pré estabelecido também pela TV.

A TV é um letal instrumento de imbecilização, e por isso mesmo eu parei de assistir. Chamo de letal porque, se não toma-se cuidado, ela tem a capacidade de realmente matar a nossa capacidade de pensar por conta própria. A influência é muito violenta, agressiva e contundente, e a fim de passar a impressão de que existe sim, espaço para o debate e o senso crítico, a TV por vez e outra permite-se contradizer, mas sem deixar as sutis evidências de que de fato não corrobora com o pensamento que ela pretende impor como o coreto.

É uma total tentativa de transformar o expectador em um ser debilitado e totalmente refém de forças muito maiores do que ele seria capaz de combater: a morte, a violência, o poder político, a ignorância, as catástrofes da natureza, as assombrações do além, Deus e o diabo, o inferno, a pobreza... tudo está contra o expectador, que se vê inerte diante desse assassino meio de comunicação que acerca-se da missão de informar as pessoas.

A informação dada como essencial e verdadeira tem de ser vista com cuidado, porque aprende-se para libertação acima de tudo, e não para seguirmos a tendência de discutir, sempre, os mesmos assuntos.

Eu não preciso mencionar a covardia de tornar a tragédia das pessoas um mero espetáculo para ganhar audiência sob a desculpa de humanização. Audiência que é abastecida com os milhões em contratos publicitários e com compra e venda de favores a empresários, políticos, intelectuais e formadores de opiniões.

Eu sinto repulsa apenas ao fato de me ver sentado em frente a uma TV assistindo a programação das emissores, sejam as de canal aberto, ou por assinatura, estes últimos, eleitos como a fuga da programação emburrecedora das massas, mas que para mim, torna-se apenas uma forma de imbecilização elitizada, nada mais.

Não tenho mais a dizer sobre este assunto.

Postagens mais visitadas deste blog

Bucolismo

Com tua carroça cheia dos restos da cidade O catador para diante da margem do rio É um rio largo, escuro, mal cheiroso Ele observa o reflexo nas águas, suspira e vai embora: - Esse rio é tipo um abismo. Todo dia passa ali, com tua carroça colorida de catador. A engenharia é uma piada tecnicista Tem uma TV quebrada Num celular, uma antena de carro, só por ironia Um CD de um grupo de Axé que já acabou - o resto de uma alegria do passado - Uma boneca vestida com roupa de mecânico Restos de móveis Restos de roupas Restos de memórias fragmentadas. Ele mira o reflexo nas águas, suspira, e vai embora: - Esse rio aí, é um imenso abismo. Todo dia é a mesma coisa. Do outro lado da margem do mitológico rio:  A vista bucólica de um jardim bem cuidado Casas em seu devido lugar Pessoas em seus devidos lugares É tudo como se fosse um sonho. Ele olha as águas, se vê no fundo distorcido, suspira, pega sua carroça e vai embora - Um dia atravesso o rio. O rio é quase sem fundo e quase sem vida.

O Lago

Caminha entre alamedas tortuosas E a abóbada de bosques sigilosos Adentro a mata o encanto avistai Repousa obliterado o grande lago. E largo encontra em límpido repouso Defronta diante em margem distorcido Silêncio com remanso se emaranha Enigma malcontente insuflado. Atira-lhe uma pedra e de onde em onda Emergirá um monstro adormecido Até que venha o próximo remanso Até que a fenda em sangue desvaneça.

A Praça

Chegando na praça central Ouço os ecos e os rumores De uma vida que parece outra Os risos de andarilhos sem caminho Os caminhos de passos tortuosos O desgaste do que antes fora arte As estátuas sem nome Os nomes nas placas sem história Folhas caídas pelo chão  Os recortes no ar, de galhos retorcidos Ominoso, lugubre e risonho Será que um dia voltarão a florescer? A cada suspiro uma mão distante me acena Miragem ou ilusão, um consolo de memória. Por que tão vazia? Por que tão pouco visitada? Por que assim, remota, esquecida? Cercada de casas sem família Cercada de muretas sem ter o que proteger Nesta praça de ruas que não vão e nem chegam Somente o velho reina Meu filho, diz o vento, é assim mesmo. Quantas vezes soube tu, alguém que guardasse teu nome? A praça tem som de tranquilidade e cheiro de saudade.