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Estilhaços

Fui catando os fragmentos pela vida

Pedaços do que foi estilhaçado

Uma diversão aqui

Um sorriso ali

Aqui tem uma carícia

Lá, cacei um pedaço daquela maciez

Aquele calor de quando a mão

Me segurou pela primeira vez.


Fui catando os pedacinhos, pouco a pouco

Ainda não está tudo, não está completo

Ainda sinto o bater frágil e vazio

De um peito pobre e inquieto.


Ainda sigo em rimas sem sentido

Em aceitar migalhas ainda sigo

Porque não aprendi, desde aquela tarde

A seguir sem o que me foi perdido.


O som e a dor, a coisa que é física

Se esparrama na malha do tempo

Se alonga e se despeja pelos dias.


Levanto

Dobro os cobertores

Faço o café

Tomo-o, sozinho, em companhia

A maciez de uma poltrona sob mim

A fria brisa que corta o meu rosto

Não é a carícia, é o mesmo convite diário

O mesmo maldito sacrifício

O que para muita gente é Domingo

Para mim é um suplício!

Por que ainda?


E então, nada, absolutamente nada

Esse maldito e infernal nada!

Esse nada que se sobrepõe, que se envolve sem convite

E se confunde em sonho, esperança, dor e ilusão

Esse maldito, o que era mesmo, que insiste aqui

Essa coisa que me toma conta, mais ou constantemente

Essa coisa, que me toma, que rouba, que prolonga o que era simples

Essa coisa, que vai, e vem, e fica, e deita-se ao meu lado, ensaboa-me, consome-me

Essa coisa que devora, que nunca vai embora, que às vezes silencia, mas está sempre aqui!

Nada!


E o fôlego

Que se pega

No fim

Da escadaria

Para assim

Seguir

O mesmo

Dia.

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