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Motivos

Motivo Que brisa fresca que desperta Eriça os pêlos dos braços Arrepia-me os pêlos da nuca Me faz ter saudades de muitas coisas De muitas tristezas deixadas pra trás Quanta loucura... Mais um outono nesta vida acinzentada Cada estação um motivo De quanto mais motivos serão necessários? Atiraram-me aqui neste corpo Como um dejeto, um desperdício Nesse projeto inconstante e inexplicável Sempre prestes a explodir! A gente anda por aí como se não  houvesse mesmo um motivo E a cada pausa pra respirar, permitem-nos tentar um sorriso. E que riso bobo quando eu olho pra esse horizonte E esqueço um pouco de tudo o que me rodeia E nessas horas também me esqueço do que sou (Do que fui) E me esqueço do que já sei o que vou ser E deixo os pensamentos um pouco em espera E espero de verdade que não seja mais uma ilusão Que não seja mais uma desculpa para seguir em frente Mas que seja o motivo que tanto procurei Já nem posso dizer, deixa pra lá. Deixa pra lá por que o

Mãe

Caiu uma tempestade em cima da casa Aquela casa pacífica Aquela casa branca, de ar leve. De repente tudo ficou pesado As portas bateram As janelas tremeram Cadeiras e mesas, sem equilíbrio, eram jogadas pelo ar Houve um estalido violento de vidro se partindo Como o som violento de uma alma se partindo Que risca e marca a mais profunda calma E atormenta a mais profunda mansidão As pessoas, surpreendidas, chocadas, tremiam O ar, pesado, ofegante E uma saudade melancólica dos primeiros dias Os primeiros passos E uma dor que só vivendo Aquele olhar forte, seguro, mais forte que a maior das loucuras Sai o filho sem fechar a porta e nem olhar pra trás Carregando dez mil quilos nos calcanhares O peso tamanho que a parede se enverga, e a porta se estrebucha. Logo antes, só permanece o calor Aquele olhar cansado e cheio de ternura Invisível. Vigilante. De mãe. - Leva um casaco, está frio lá fora.

Pedido de Casamento

Posição de príncipe campeão E postura de donzela intocável Inspiradora de cantos e cânticos Cujo perfume que exala Libera a imaginação Inspirador de Odes e Entoadas Cujas pessoas sempre se lembram E se sentem mal. Ele está pronto Nervosamente se ajoelha E ajoelhado prepara o pedido Pondera as palavras Pigarreia o tom de voz Muuuu, tilim tilim passa a abesana passa Meneia os chifres pra lá, meneia os chifres pra cá Pasto, pasto, pasto, ruminando pensamentos Enquanto um rastro de esterco se segue Invadindo o castelo encantado das fadas Horrorizadas pela repulsa as coitadinhas voam E tapando os narizes de horror, dizendo: - Que horror! Que horror! Que horror! Calmamente a vaca pasta, e passa Com a sabedoria mais pura do gado O homem, desconcertado se ergue, observa, pondera Limpa os joelhos e passa a refletir sobre a importância do meio ambiente.

Vulto na Neblina

Não é veia, nem vinho Não veio. Não é nada desperto, decerto. Vês a névoa que nos cerca? Esta névoa que nos arrebata às mentiras e desilusões? Pois bem, eu não Eu não vejo nada. Imagens: O que é então esse mundo miserável? Que torna irmão contra irmão E faz o justo ser levado a crer Que é crente contra o injustiçado? Onde não guarda rancor com quem inventa e quem faz sofrer Mas quem sofre como se fosse de provocação Estes famintos, estes enfermos e quase mortos Estes sedentos por direitos de viver e libertação Que carregam um ímpeto poderoso em seu peito Caídos, quase sempre, como escombros dispostos pelo chão. Colônias e mais colônias, colônias de todos os aspectos Para disfarçar o cheiro reto. A justiça do homem feito não é a justiça pela palavra Dinheiro, o senhor de todas as verdades. Creio em Deus, a verdade e os homens Creio em seu cetro Creio em seio lácteo, luminoso Tua borda enverga para o infinito Colônias Estás preso em uma colônia monumental

Poema para Doentes

Passeio, sempre, como um que comeu e bebeu poeira Calçada, mas a cabeça lá no céu No alto inalcançável Que erro grotesco e desumano! Os mastros estão todos vazios E as pessoas não fazem mais perguntas Estes são ventos novos, ventos frescos Se um pano vermelho ou verde tenta se erguer Derruba-se sob palavras violentas de doce libertação! Sonhar é um organismo defeituoso Numa era em que sonhos são possíveis Tanto quanto os abraços.

O Tumbeiro Fantasma

No século da glória de Pingala Percebe-se uma verdade atroz No sentindo e fazendo involuntário Ouça, constante como um sino de chegada Os sons de correntes se arrastando pelo chão E o tilinte dos grilhões atados em vossas mãos Um magote, falsamente ordenado E repleto de superstição O seu discurso ato é falho E sua voz que tanto clamas não é sua Mas veja tuas mãos, e esta fala Em constante oposição Há grilhões? Não! Há palavras postas em teu cérebro? Não sabe, não vês. A dúvida é o suporte da loucura Portanto duvidosa Portanto, verdade, distante, impossível. Um sol se põe, eu vejo O saber necessário, não sabemos. A luz me alcança Mas entre nós Um abismo de suposições e medos. Salta Grilhões se partem Morro?
Desperdício é a juventude que não sabe o poder que tem E tem como inimigos a própria incoerência da liberdade A própria falta de disposição de si E os excessos contra aquém Para provar a si mesmo Algo.

Flora

Uma luz límpida atravessou a janela Tocou-lhe o rosto com delicadeza Uma garoa que acaricia o jardim tão duramente cultivado O dia não te amanheceu hoje porém Como muitos não irão. Olha lá fora, esses olhos que acabaram de acordar E veja por si só, como haverá de ser Sem escolha, sem pedido: Túmulos e mais túmulos De histórias que não conhecemos, mas que valeriam um verso! Observe quantas rosas ali dormem Tranquilas e conformadas Como um mar solitário depois da tempestade. O cenho franze de tristeza, a vida ensina Mais ou mais do que a luz Que atravessa-lhe a janela E é quando tiramos o véu negro Aceitamos E saberemos quando olharmos para trás Nossa rosa também estará ali Um soluço preso na garganta não nos abandona Toda luz límpida cruza a janela que se deixa aberta O dia amanhecerá, porém.