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O Quarto Escuro

Rua do Nascimento, número 1985. Rua dos nascidos, dos resolvidos, rua da esperança talvez. Como daria pra saber sendo que nunca saí daqui? Sou um morimbundo constante, sinto às vezes. O que é morimbundo? O estado de expectativa pré-morte, é o que sinto, e como estou sempre aguardando de quatro feito animal, isso não parece tão errado de afirmar. A vida inteira, sinto, passei aqui dentro, neste quarto, neste endereço tão simplório, e já faz algum tempo que não vejo a luz. Lembro que a princípio tudo era iluminado, então me guio pelas parcas lembranças de como era aqui dentro. Eu lembro que vivia no berço, a sensação de mobilidade era tão pequena, mas o conforto e sabor pela vida eram tão grandes, e a primeira memória que tenho é a de meu pai me carregando para tomar banho. Um sentimento de segurança e proteção tomavam conta de mim, quando aquelas mãos calejadas, porém carinhosas, carregavam meu pequeno corpo e me jogavam para ser banhado na pequena bacia com água morna. A sensa

Tropical

Entardeceu cedo esta noite, pois já ouço o sino das dezessete horas. É tarde demais, diria, pois já ouço o badalar dos sinos. Quem badala o sino? E a sina? É assim mesmo. Tem horas que a vida é feita de um monte de frases curtas. Deixa. Para. Olha. Só. Arre. Esquece... Essa coisa que aquece de vez em quando é verdade ou só brincadeira de ser feliz? É tipo um calorzinho assim no peito, mas esse calorzinho é esperança? Por que o amargo é tão certo? Por que o doce é vindo de um processo tão difícil e complicado? A natureza já nos apresenta isso, pois existem mais desertos quentes e frios do que florestas tropicais, mas a gente insiste em ganhar nosso lugar à sombra. Assim que souber da sina, assina embaixo e só espera o sino. Essa hora, tarde demais, parece que as coisas funcionam assim, com trocadilhos pobres, mas deixa. E se for só isso mesmo? Queria chegar no oitavo andar, mas e se nasci para o segundo, porque não hei de por a minha poltrona num lugar melhor onde bata luz, sol

Quem sou eu afinal?

Retirei este trecho do meu livro de fantasias favorito: Irmãos, não falem mal uns dos outros. Quem fala contra o seu irmão ou julga o seu irmão fala contra a Lei e a julga. Quando você julga a Lei, não a está cumprindo, mas está agindo como juiz. Há apenas um Legislador e Juiz, aquele que pode salvar e destruir. Mas quem é você para julgar o seu próximo?  Tiago 4:11-12 Pois bem, quem sou eu? Direi, peço licença a vossa divindade, porque eu estou aqui neste lugar que mais parece um circo de horrores do que uma obra divina. Eu posso dizer que não gosto da maior parte das pessoas que já conheci, mas eu posso dizer também com quase absoluta certeza o quanto eu desprezo pessoas religiosas, especialmente os cristãos. Cristãos são a nata da hipocrisia na sociedade, sem contar o cinismo, a falsidade intelectual e a cretinice de comportamento. Certa vez um cristão sente os desejos que um ser humano normal sente, de desfrutar do que o próprio mundo oferece, coisas que o se

Goth Love

Enquanto teu corpo se decompunha Eu via essa alma podre como a minha Éramos como duas vagabundas Rolando em cima da moral corrupta Dessa humanidade tão decrépita Mas meu amor, tua alma com a minha Convergia nesse vômito necessário Estávamos a um passo da morte do vigário E que se danem, não eramos, não seremos Nunca seria santa Mas por que a tua confusão tão tardia Permitiu que a tudo desintegrasse? Isso não mais parece um poema Senão um desabafo de amargura Esteja aqui no último momento Dessa interminável tortura E se? Não ligo Se aponto para o norte Na verdade paro em meu umbigo E assim vou seguindo

Mendigo

Alguém me atire na cabeça, exploda meus miolos, de repente a dor passa. Essa dor de um desejo que não pode ser saciado, porque eu sou um ser de componente pobre, e tudo o que minha vida se resume é a isto, uma série de desejos, um empilhado de desejos, pra me disparar algumas substâncias químicas em meu cérebro e criar-me a ilusão de que eu não sou um miserável solitário que daqui não levara nada, a não ser uma dor sem sentido na hora da morte. Alguém por favor acabe logo com isso, já que eu não posso causar a fatalidade em mim mesmo para não trazer uma tristeza incompreendida às pessoas que são egoístas demais pra entender o que eu carrego aqui dentro. Enquanto desfrutam da minha máscara, eu estou aqui preso em mim mesmo, encarcerado nessa falta de vontade de me superar, porque eu estou cansado. Cheguei num ponto onde não sinto mais expansão, sinto um tédio da estagnação da vida. Nada cresce, nada diminui, nada vai para lugar algum, e isso está acabando comigo aos poucos. O paras

Aquele velho tédio que me diverte

Eis o porque eu gosto tanto de você, embora não pareça, porque não é do meu feitio: você nunca está satisfeito, e isso é ótimo. Existe sempre esse tormento impregnado na sua mente, às vezes com a coisa mais estúpida e irrelevante. Isso é um deleite, acredite. Mas eu odeio meu melhor amigo... Porque ele é fraco. Vive em negação da realidade, o que me diverte, claro, mas comumente eu me impaciento, e de tanto já dizer, opto por calar-me. Já pensei no quanto me aborrece que as pessoas acreditem ser verdade a própria negação dela, enquanto ser verdade é ir desesperadamente em busca de uma vida que nega tudo aquilo que realmente precisamos. Essa imaginação confluente sempre nos faz pensar que somos mais do que somos, mas no fim das contas, no auge da nossa solidão depressiva, entendemos realmente que tudo o que fizemos até este raro momento de lucidez, não passou de uma mera fantasia para não nos entregarmos de verdade à cruel realidade: estamos aqui para nada apenas. E com

Édipo

Eu te amo? Eu te odeio? Eu sinto que posso estar refém Desta treva absoluta? Má vontade de ser Ou falha de conduta? Conhece-te a ti mesmo Quando não conhece O que o faz continuar Este filho pródigo Que à casa tenta retornar Não sente vontade de perdão Nem arrependimento. De pausa em pausa Tudo o que cresce É só rompimento. A pele nem mais é pele É armadura. Mas não sou guerreiro Sou mais um troglodita Perdido nessa selva de amargura.

Ghost

Quem dera soubesse dizer Quem é o inimigo desta guerra De batalha em batalha Viro menos homem do que cai-me terra Estas palavras tão cheias de preguiça Acertaram o mar Mataram talvez um nadador inocente? Quem dera soubesse o que fazer

Pote de Areia

Larguei a mão com suavidade Dentro deste pote de areia Randômico Ou ampulheta Tanto faz É parte da imaginação Escorreu a areia por entre os dedos Vi todas as minhas condições Li a mão como a um livro raro Que sensação de calma Como descer na lagoa da redenção Que quando vi Estava idosa Olho pra trás Não olhei nem olharei Olho Nas pegadas que ficam na praia Tortuosas Vale a pena Chove e seca ao mesmo tempo A vida é um sempre Pote de areia Querido eterno ente

Ode a Uma Alma Destruída

Serei a eleita a destituir teu poder sobre mim? Enquanto aqui ajoelho submissa Você me pega pelos cabelos Ergue minha cabeça e faz de mim A escrava mais que absoluta! Até quando virá esta perdição? O quanto mais resistirei à luta? Sou apenas uma alma frágil, eu sei Ela está aqui exposta como ferida aberta Arde a cada leve brisa A cabeça estoura ao mais ameno som Ou me deixa ou me deixa Destrói-me até o último dia Desapareça ou fuja Largue-me no lamento ou na queixa Enquanto me jogo no chão, indefesa É isso, sou isso, apenas isso Esse pedaço de autopiedade Sim! A vida não é brincadeira! Sim, estamos diante do colapso mortal Entre a casta que aborta a esperança Ou a multidão que se finge de freira Mas pouco importa enquanto cavo este poço infindo E descubro a cada metro fétidas verdades Sim! É isso? Sou isso? Apenas isso? Essa larva interminável corroendo com amargura No enquanto que não sai de mim Ganho pouco a pouco uma escuridão tardia Deixo uma pel